Audiência em Campo Verde debate uso de agrotóxico

Mato Grosso é campeão brasileiro na utilização de agrotóxicos. Pelo menos 140 milhões de litros de herbicidas, inseticidas e fungicidas foram utilizados nas lavoras no ano de 2013, o que equivalente a 43 litros de veneno por habitante, conforme o Instituto de Defesa Agropecuária do Estado de Mato Grosso (Indea), Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e Sindicato Nacional das Empresas de Aviação Agrícola (Sindag). Para debater este assunto, uma audiência pública é realizada nesta terça-feira (04), das 8h às 12h, no Fórum da Comarca de Campo Verde (a 127 km de Cuiabá).

Conforme a secretária de Estado de Meio Ambiente, Ana Luiza Peterlini, a ideia é que esta seja a primeira de uma série de audiências a serem realizadas nas diferentes regiões do estado onde os agrotóxicos são largamente utilizados na agricultura, como forma de envolver produtores, autoridades locais, sociedade civil organizada e a população para discutir e se conscientizar sobre o tema, que impacta a vida de todos. “Os próprios produtores são os principais afetados pelo alto índice de uso dos agrotóxicos, pois têm contato direto com os produtos a partir da inalação pelo ar, ingestão na água e nos alimentos ou mesmo contaminação por meio do solo. Nosso objetivo principal é esclarecer, conscientizar."

O evento é uma iniciativa do Comitê Multi-Institucional, entidade que trata de questões relativas às políticas de integração e aperfeiçoamento do sistema judiciário em Mato Grosso, envolvendo os tribunais de Justiça (TJ) e do Trabalho (TRT/MT), Justiça Federal, os ministério Público Estadual e o do Trabalho (MPT), Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), além das defensorias públicas de Mato Grosso e da União e entidades ligadas à magistratura. O grupo conta ainda com a participação das secretarias estaduais de Meio Ambiente (Sema), de Justiça e Direitos Humanos (Sejudh), de Saúde (SES) e de Agricultura Familiar e Regularização Fundiária (Seaf) e da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT).

Para o secretário de Estado de Justiça e Direitos Humanos (Sejudh), Márcio Dorileo, é preciso que a sociedade e principalmente os produtores rurais despertem para uma visão mais crítica sobre os agrotóxicos. Se por um lado as empresas, muitas delas multinacionais, têm forte atuação no estado, por outro compete aos mato-grossenses olharem de maneira mais estratégica para possíveis eventos negativos nas lavouras. "Será que precisamos mesmo usar esse produto? Não existe uma opção mais sustentável? Por que este produto que não é utilizado em outro país é liberado aqui no Brasil? Existem pesquisas que realmente comprovam que não faz mal à saúde humana? Ou seja, precisamos nos unir para formar uma massa mais crítica sobre essa questão."

Outras instituições também vão integrar a lista de parceiras para promoção das audiências públicas e seminários nos municípios mato-grossenses, entre elas o Instituto de Defesa Agropecuária do Estado de Mato Grosso (Indea), a Secretaria de Estado Educação (Seduc), Unemat, Ministério Público do Estado (MPE), sindicatos rurais, associações de pequenos produtores, etc.

O consumo de agrotóxico

Atuante na área como coordenador do Fórum Mato-grossense de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos, o procurador do Trabalho (MPT-MT) Leomar Daroncho contou que já realizou no mês de fevereiro deste ano reuniões em Campo Novo dos Parecis, Sapezal e Campos do Júlio para apresentar o projeto de pesquisa “Avaliação da contaminação ocupacional, ambiental e alimentar por agrotóxicos na bacia do Juruena”, realizado em parceria com o Núcleo de Estudos Ambientes e Saúde do Trabalhador da UFMT.

Além de coletar material para a pesquisa, como água e sedimentos, a comitiva alertou representes de sindicatos dos trabalhadores rurais, profissionais da saúde, professores e a comunidade mais vulnerável sobre os prejuízos da exposição aos agrotóxicos. "A falta de dados confiáveis e a deficiência na informação e/ou de alternativas das vítimas do modelo de produção adotado ainda são os maiores adversários da defesa do trabalho e da vida em condições seguras."

Conforme a Associação de Engenheiros Agrônomos de Sapezal, somente na unidade de recebimento de embalagens de agrotóxicos da cidade são recolhidas, anualmente, cerca de 600 toneladas de embalagens vazias. O número ajuda a entender como Mato Grosso se tornou o campeão brasileiro na utilização desses produtos. Para o procurador do MPT, além dos milhões de litros de veneno que são despejados na água e no solo, contaminando os rios e os alimentos e gerando passivo ambiental, há ainda os prejuízos causados pelo descarte incorreto das embalagens.

Riscos à saúde

No início de abril deste ano, o Instituto Nacional de Câncer (Inca) pediu oficialmente a redução do uso de agrotóxicos no país, já que o Brasil se tornou o maior consumidor desses produtos no planeta, ultrapassando um milhão de toneladas em 2009 – equivalente a um consumo médio de 5,2 kg de veneno agrícola por habitante. A informação é do estudo “Agrotóxicos no Brasil: um guia para ação em defesa da vida”, publicado em 2011 pela pesquisadora Flavia Londres.

De acordo com o Inca, essas substâncias têm diferentes impactos na saúde, desde intoxicações agudas, como irritação da pele e dos olhos, coceira, cólicas, vômitos, diarreias, espasmos, dificuldades respiratórias, convulsões, até o risco de morte. Já em longo prazo, pode haver aumento da infertilidade, impotência, abortos, má formação, neurotoxicidade, desregulação hormonal, efeitos sobre o sistema imunológico e câncer.